Amazonas desativou 85% dos leitos de UTI criados pelo governo federal para Covid-19 em 2020
Ao menos 117 das 137 vagas públicas criadas a partir de fevereiro foram fechadas; para OMS, desmonte foi prematuro
O estado do Amazonas desativou 85% dos leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do SUS que haviam sido criados entre fevereiro e julho de 2020 por causa da Covid-19. Os dados são de um levantamento feito pelo Instituto Votorantim com base em informações da Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas.
A capital do estado, Manaus, vive recorde de hospitalizações e tinha 58 pessoas à espera de leitos de UTI até o último dia 12 de janeiro, depois de ter desativado, entre julho e outubro de 2020, 117 UTIs do SUS das 137 criadas de fevereiro a julho do mesmo ano.
O levantamento foi desenvolvido, inicialmente, para avaliar a disposição de leitos de UTI públicos e privados nos estados brasileiros, bem como a oferta de respiradores. No entanto, com os dados em mãos, a equipe do instituto reparou no elevado percentual de leitos desativados.
A Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas não respondeu aos questionamentos feitos pela reportagem até a publicação deste texto.
Manaus vive seu pior momento da pandemia com médicos relatando terem que escolher quais pacientes assistiriam enquanto outros morriam por asfixia devido à baixa oferta de oxigênio nos hospitais em Manaus. A situação é tão grave que cerca de 700 pacientes devem ser transferidos para outros estados.
Um dos pontos críticos da crise é a falta de leitos de UTI para pacientes críticos. "Ou seja, ter mantido o número de leitos criados ajudaria a diminuir a crise neste momento", diz Rafael Gioielli, gerente geral do Instituto Votorantim.
O responsável pelo levantamento realizado pelo instituto explica ainda que manter leitos inativos tem um custo alto aos cofres públicos e que a desativação provavelmente aconteceu devido à queda na demanda.
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"O problema é que a evolução da pandemia parece ter vindo na direção contrária dessa medida, ampliando a demanda por leitos de forma muito rápida, numa velocidade que parece ser maior do que aquela em que os governos conseguem ativar os leitos."
Outros cem
pacientes devem ser transferidos para a rede estadual de Goiás. As
transferências por meio de avião da FAB (Força Aérea Brasileira), no fim do
dia, não foram possíveis devido à falta de oxigênio para uma viagem segura.
A demanda por oxigênio no estado é três vezes superior à capacidade produtiva dos fornecedores, segundo informou o governo do Amazonas. A gravidade da situação é tamanha que o governo estadual requereu o estoque de oxigênio de 11 empresas por meio de notificação extrajudicial assinada pelo secretário estadual de Saúde do Amazonas, Marcellus José Barroso Campêlo. E caso haja desobediência, a notificação prevê o uso de força policial para obter o insumo.
Diante da crise em Manaus, o presidente Jair Bolsonaro disse nesta sexta-feira "nós fizemos a nossa parte" e voltou a defender tratamento precoce com cloroquina e Hidroxicloroquina medicamento que ele e General Mourão usou para o novo coronavírus.
"A gente está sempre fazendo o que tem que fazer. Problema em Manaus, terrível o problema lá. Agora nós fizemos a nossa parte, [com] recursos, meios", afirmou o presidente, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.
ANTES DA HORA
Manaus desmontou antes da hora a infraestrutura montada na primeira onda de Covid-19 e isso contribuiu para o atual colapso nos serviços de saúde, afirmou nesta sexta (15) Mariângela Simão, vice-diretora-geral da OMS (Organização Mundial de Saúde).
Como mostrou a Folha em outubro, leitos clínicos e
de UTI do SUS abertos temporariamente durante a pandemia foram fechados pelo
Ministério da Saúde quando os casos de doença começaram a baixar.
Dos 14.843 leitos de UTI adultos e 249 pediátricos habilitados pelo ministério desde abril, restava no final de outubro pouco mais de um terço —5.233 de adultos e seis pediátricos, segundo a pasta.
“O que está acontecendo no Brasil deve servir de alerta: não baixem a guarda por uma falsa sensação de segurança. Não fechem as instalações que já têm, porque a pandemia não acabou ainda”, afirmou Simão, que é brasileira e chefia a área de acesso a medicamentos, vacinas e produtos farmacêuticos da agência da ONU.
Segundo o diretor executivo para emergências da OMS, Michael Ryan, outro agravante na capital do Amazonas é que, além dos profissionais de hospitais, também estão sendo contaminados funcionários de laboratórios e centros de vigilância, prejudicando toda a cadeia de combate ao coronavírus.
Ryan afirmou que, pelos registros da OMS, há 400 pessoas diagnosticadas com Covid-19 na fila para serem hospitalizadas em Manaus, que já atingiu 100% da capacidade em suas UTIs.
Segundo ele, Rondônia e Amapá também vivenciam crescimento semelhante ao do Amazonas no número de novos casos e hospitalizações.
“Não é a nova variante que está na raiz desse crescimento. É muito fácil colocar a culpa no vírus, mas infelizmente o problema é o que as pessoas não fizeram”, afirmou Ryan. “Se o vírus fica mais eficiente, as pessoas precisam redobrar a prevenção e o combate.”
De acordo com a líder técnica para Covid-19 da OMS, Maria van Kerkhove, ainda não se sabe se a variante encontrada em passageiros que saíram do Brasil se transmite mais rapidamente que as outras.
Ela disse que a entidade está estudando a nova cepa, em conjunto com cientistas brasileiros.
FONTE: UOL.COM.BR
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