Brasil deve ganhar acesso a fundo de US$ 100 bi dos EUA na área de defesa
Após a designação do Brasil como aliado
preferencial Extra-Otan pelos Estados Unidos, os dois países tentam fechar
acordo de cooperação militar que pode dar às empresas brasileiras de defesa
acesso a um fundo americano de quase US$ 100 bilhões anuais para o
desenvolvimento de produtos na vanguarda tecnológica do setor.
O acordo, que está em reta final de negociação, é
encarado por autoridades dos dois lados como um avanço inédito no
relacionamento bilateral. Poucos países fora da Organização do Tratado do
Atlântico Norte (Otan) têm um acordo RDT&E (sigla em inglês para pesquisa,
desenvolvimento, testes e avaliação) firmado com os Estados Unidos.
É o caso de aliados importantes dos americanos em
regiões com potencial conflito, como Israel e Coreia do Sul. Nem todos os
europeus chegaram a esse tipo de parceria. O fundo RDT&E teve US$ 96
bilhões no ano fiscal de 2019 e é o principal instrumento do Departamento de
Defesa (DoD) dos Estados Unidos para manter a supremacia tecnológica na área
militar.
O governo Donald Trump tem buscado fortalecer esse
fundo nos últimos anos como forma de fazer frente aos crescentes investimentos
da Rússia e da China em equipamentos bélicos de ponta. Centenas de projetos
estão sendo desenvolvidos — cada um possui uma rubrica específica no orçamento
do DoD — com esses recursos.
Caças de quinta geração, novos armamentos
hipersônicos, sistemas de defesa aérea, tecnologias de defesa submarina,
mísseis balísticos e de cruzeiro fazem parte da lista. Se o acordo bilateral
for realmente fechado, empresas brasileiras poderão estabelecer parcerias com americanas
para trabalhar no desenvolvimento compartilhado de um novo produto e
tecnologia, bem como ter acesso ao fundo.
Algumas áreas, como defesa cibernética, já são
apontadas pelo governo brasileiro como candidatas a uma parceria mais
aprofundada. Nos Estados Unidos, há interesse do Escritório de Pesquisas Navais
(ONR) e do Comando de Desenvolvimento de Capacidade de Combate (RDECOM) em
iniciativas conjuntas.
O Itamaraty e o Ministério de Defesa tratam
diretamente do assunto e apostam na conclusão do acordo neste ano. Em nota, a
embaixada americana em Brasília confirmou o estágio avançado das negociações.
“Estamos ansiosos para concluir um acordo RDT&E
com o Brasil e fazer bons progressos. O ‘timing’ da assinatura ainda não está
determinado, mas o forte compromisso mútuo para alcançar o acordo referente a
nossa crescente relação bilateral em múltiplas frentes”, afirmou a embaixada.
Os Estados Unidos queriam a entrada imediata em
vigência, alegando que ele é um desdobramento de outro já implementado, o
Acordo sobre Cooperação em Matéria de Defesa (DCA) — firmado em 2010 e
ratificado em 2015 —, e do Acordo Mestre de Troca de Informações (MIEA).
A consultoria jurídica do Itamaraty tem o
entendimento de que esses dois tratados não dispensam a tramitação legislativa
do RTD&E. O problema é que isso ainda pode levar vários anos depois da
assinatura.
Segundo fontes do governo brasileiro, o status de
aliado extra-Otan não é um pré-requisito para evoluir no assunto, mas facilita
a cooperação efetiva entre os dois países e a concretização de parcerias.
A designação, que ocorreu durante visita do
presidente Jair Bolsonaro a Washington em março do ano passado, representa uma
espécie de “atestado de con!ança” da Casa Branca para o desenvolvimento de
projetos comuns.
A diplomacia brasileira avalia que o novo acordo se
tornará uma das grandes colheitas da aproximação entre Bolsonaro e Trump, que
já resultou no tratado de salvaguardas tecnológicas para a exploração comercial
da base de Alcântara e no apoio americano à entrada do Brasil na Organização
para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Por: Daniel Rittner, Valor — Davos (Suíça)
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